Em 1976, um amigo apareceu lá em casa com um disco (LP fique claro) que ele pegou emprestado na Biblioteca Tomas Jefferson. Ao contrário do que eu imaginava enquanto ele tirava o disco da sacola, não era de um artista americano, mas sim brasileiro. Tratava-se do álbum Radamés Gnatalli Sexteto. Era uma época em que o rock progressivo estava em seu apogeu e nós não éramos exceção aos jovens da época, mas gostávamos de explorar um pouco além e ouvir esse álbum foi um grato choque. Ali estava a música brasileira de qualidade, que não ouvíamos na rádio. Com quase 70 anos, Radamés foi o pianista, compositor e arranjador que mudou nossos conceitos e de muitos outros da minha geração. Ali não estava o chorinho como algo reverenciado, intocável. O que ouvíamos era música viva, como tem que ser, livre de modismos e pronta para ser a referência. Radmés Gnatalli Sexteto é um álbum que hoje não deixou de ser moderno e instigante. Esse músico, nascido na Porto Alegre de 1906, filho de imigrantes italianos, reuniu músicos da elite para formar o seu sexteto, a começar pelo multiinstrumentista de cordas José Menezes, o baixista Pedro Vidal Ramos, o baterista Luciano Perrone, Chiquinho do Acordeon e o pianista Laércio de Freitas. Os cincos primeiros eram integrantes do quinteto com o qual Radamés ajudou a criar o alto padrão orquestral que marcou a música brasileira nos tempos da Rádio Nacional por volta de 1930, mas foi com o sexteto, que ele viajou pela Europa, em 1960, deixando os europeus estupefatos com seus arranjos modernos para o choro. Quase duas décadas depois, dois adolescentes ficaram igualmente boquiabertos. Mas o mais curioso é que ouvir esse álbum três décadas depois do seu lançamento não deixa de causar surpresa. Ali estão músicas de Pixinguinha (1x0, Cochichando, Sofre porque queres), João de Barro (Urubu Malandro), Catulo da Paixão Cearense (Por um beijo), Luiz Bittencourt (Nova Ilusão) e do próprio Radamés (Meu amigo Tom Jobim e Divertimento para seis instrumentos). Nessas composições, o grupo de instrumentistas mostra uma incrível versatilidade e o uso de dois pianos, é algo primoroso. Infelizmente, um sistema para proteger o disco contra pirataria, dificulta sua execução em alguns “players”, mas não invalida a grandeza da obra de Radamés Gnatalli e a obrigatoriedade deste disco em qualquer coleção que se preze.
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